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sábado, 23 de junho de 2012

52)-Parte III: Não! (Crônica)



O tempo não parou. Tive certeza disso quando vi a Luana sentada na frente da escola. Ela estava de cabeça baixa, segurava um livro – me parecia um romance – não consegui ler o título. O seu rosto estava em silêncio. Sua boca sussurrava as passagens da trama, lançava-as ao ar e ninguém as ouvia, mas eu as via se perdendo, seguindo sem rumo por qualquer caminho. Os olhos amendoados de Luana refletiam as saudades, os risos, os prantos, os encontros e os desencontros que a envolvia naquelas páginas. Os cabelos longos cobrem parte do rosto e deixa desnudo o pescoço aparentemente inocente, fonte de desejo, portal que me levou aos segredos mais íntimos daquele corpo cheio de pecado e gozo profundo. Exijo de você, leitor, mais respeito! Não admito que leia a minha intimidade como se estas fossem clichês de pornochanchada barata. Foram momentos como estes que me trouxeram pra cá e me deixaram longe da minha Princesa. Enfim, deixarei isso para um outro momento, o que importa agora é o meu reencontro com a minha amada. Eu deixei que os meus olhos navegassem pelos mares daquela beleza proibida com a missão de regressar-me ao corpo que estava resguardado por dentro da camiseta branca do colégio que mantinha em segredo aqueles seios erguidos, frescos e insaciáveis que trazia pra vida a menina em forma de mulher, a calça azul do uniforme dava tom e contorno às linhas curvas das coxas endiabradas que despertavam o prazer até nas almas mais ingênuas – se é que existe alguma alma ingênua.
Hoje é dia 27 de junho, aniversário da Luana, eu não me esqueci. De presente trouxe a carta que traz palavras carregadas de mim. Acho que ela irá gostar de saber que um dia eu escrevi sobre nós, guardei esses sentimentos por muitos anos, não deixei me abater pelo tempo e aqui estou, pronta para entregar um trecho da história que juntas vivemos. Bate o sinal, as pessoas correm em direção ao corredor central que leva-os para as salas. Luana ergue a cabeça, lança um sorriso em direção incerta, marca a página e fecha o livro, se levanta e enquanto todos seguem seus destinos com passos eufóricos ela permanece parada na porta do colégio, parece que espera alguém e não tarda para que uma outra beldade tome nos braços a minha Luana! O abraço e o beijo que um dia foram meus, só meus, agora fazem parte de outra pessoa. As duas adentraram a escola e abraçadas caminharam juntas para a sala de aula. O corredor parecia não ter mais fim, a carícia entre as duas eram das mais intimistas possíveis, aliás, aquele dia era um dia especial. Num dos bolsos da mochila daquela que ocupara o meu lugar havia uma rosa – Luana adora rosas – a fragilidade das pétalas encanta quando toca na pele dela.
A Luana não poderia ter me esquecido! Levei as duas mãos ao rosto e inconformada, gritei; Não! As pessoas sempre me esquecem, o tempo parou pra mim e fez com que as pessoas que eu amava me esquecessem. Maldita memória! Sempre vítima do tempo. Fui vítima do tempo e do desamor. Fraca, encostei-me na parede e em silêncio permaneci por algumas horas. Pensativa, tentei buscar a reposta do porquê. Amanda... Nossa amiga, tratou de ocupar o lugar que foi meu no coração de Luana. Talvez elas já estivessem se relacionando antes da minha partida... Guardei a minha paixão dentro do peito por tanto tempo e quando me deparo com ela a vejo no impossível. Esperava me entregar novamente à Luana, mas como? Não tenho forças nem para procurar saber se algum dia fui traída pelo Amor que descobri nos lábios da minha Princesa. Ferir-me mais pra quê? Na verdade eu já não sinto mais a dor, estou anestesiada pela minha última atitude. Revirar o passado é difícil, assim como voltar é difícil, ver o meu amor caminhando num corredor e adentrando em outro coração é um sofrimento que eu não esperava sentir agora...
Sentei-me no chão, reli a carta, as lágrimas que escorriam dos meus olhos caiam sobre as palavras como meteoro e as desfaziam pouco a pouco. Passaram-se instantes e vi que todas as palavras deixaram de existir. Na superfície do papel havia apenas borrões de uma história sem final. Não entreguei a carta à Luana, nunca a esqueci e nem sei se, algum dia, vou conseguir esquecê-la. O meu coração é a morada dos momentos.
Eu aqui sentada, sozinha, seguro em minhas mãos uma folha de papel borrada e amassada, olho para cima e imagino a Amanda tirando a rosa aveludada da mochila, presenteando Luana – as duas sorriem uma para outra – o perfume da rosa impregna o âmago da amante, o abraço é mais quente hoje, a troca de olhar é mais profunda e o beijo na boca é o ponto final deste texto.

Continua...
  

segunda-feira, 11 de junho de 2012

51)-Parte II: Vaivéns (Crônica)



Voltar é difícil. Dá uma sensação de tristeza, bate uma saudade... Sim, sensações estas que me levam a um ligeiro arrependimento. Por que fui amar alguém? Não sei, apenas sei que jamais as coisas serão como antes. O meu quarto está frio, a luz está apagada, a janela está entreaberta permitindo a entrada de um feixe de luz natural que ilumina parcialmente o cantinho que ainda é meu. A minha mãe manteve a porta trancada desde o dia da minha partida, os móveis ainda permanecem no mesmo lugar, os livros, os ursos, as fotografias, as minhas canetas agora são apenas recordações e não mais parte de mim, daquela vida que vivi ou daquelas coisas que senti. Aquele cantinho, que sempre foi meu, agora é um cenário mórbido. Triste? Sim... Mas eu voltei. Quero desenterrar as palavras que aqui deixei. Quero relê-las. Quando eu as escrevi não tive coragem de entregar ao meu último Amor, me arrependo por isso, ainda hoje sofro.
Aqui estou diante das minhas últimas palavras. Nesta carta eu narrei os momentos que protagonizei junto da minha Princesa. Passamos um bom período nos censurando, nos amando veladamente... Você, leitor, aquiete-se! Leia silenciosamente a carta que escrevi e que ainda hoje permanece aqui, sobre a minha escrivaninha.

Oi Luana!

Eu espero que você esteja bem. Sabe, nos últimos dias tenho pensado muito em nós, no que vivemos juntas, das nossas confidências, da nossa primeira conversa... Nossa! O tempo passou tão rápido... em mim ainda existe a vontade de viver um pouco mais da nossa História.
Nunca hei de esquecer aquele dia em que andávamos juntas no parque de mãos dadas, o vento forte em nossas faces, as folhas caindo das árvores, o sol brilhando só para nós, o céu azul, tudo foi tão lindo... Esse dia passa diante dos meus olhos como um Filme. Lembra daquele “Eu te Amo”? Ficamos tão extasiadas. Confesso-te que o meu coração bateu forte e o seu?
Desde o momento em que nos conhecemos, na festa da escola, jurei para mim mesma que seria você a pessoa que eu confiaria todos os meus sentimentos. Você me viu chorar muitas vezes, me fez rir outras tantas. Fomos uma realidade. Uma realidade louca! (risos)
Lembra do dia que nós brigamos? Foi por um motivo tão idiota, ficamos sem nos falar por uma semana, mas nós nos amávamos e não resistimos a distancia, nos abraçamos, os nossos corpos estavam fervorosos e nem precisamos dizer nada, apenas nos olhamos e vimos refletidos em nossos olhos o sentimento ainda mais latente, vivo, nos beijamos pela primeira vez... Naquele momento percebemos que o Amor era uma coisa que existia de verdade.
Eu quero te dizer que eu não me arrependo de nada que fizemos juntas, pelo contrário, me arrependo das chances que tivemos de irmos além da nossa loucura e deixamos passar. Incrível não?! Você chegou assim, de pára-quedas, nessa confusão chamada “minha vida” e já foi tomando conta de mim. Eu não me imagino mais sem você.
Linda. É assim que você é quando fica brava comigo. Quem eu serei sem as tuas broncas, sem os teus abraços e sem o seu perfume? Ninguém, ou melhor, serei uma metade sem razão.
Ao seu lado eu fui mais do que feliz, fui um ser completo. Você é mais do que uma melhor Amiga, você é a minha paixão. Por isso, nunca conseguirei te agradecer o suficiente pelas longas horas que passamos juntas. Nunca... Nos períodos difíceis, nas horas felizes e nos momentos mais loucos era você que estava ali, ao meu lado.
Saiba de uma coisa: “Eu te Amo e Sempre vou te Amar.”

Daquela que sempre te carregará no coração: Cristina M.   
      
Por que a minha mãe deixou essa carta aqui esses anos todos? Será que ela quis deixar vivos os meus últimos sentimentos? Ela sempre soube de tudo... Para mim essas palavras estão mortas, vim desenterrá-las e encorajar-me a entregar esta carta à Luana que deve estar triste a espera de alguma justificativa, sei lá... Algo concreto que explique essa minha partida trágica.
Algum tempo passou, nesta casa me tornei uma recordação, assim como todos os meus abjetos. É certo que alguma hora minha mãe entrará aqui, neste exílio que foi meu, se lembrará de mim, mas sobre a escrivaninha só restarão a caneta e os dois CDs. Esses sentimentos, que um dia foram meus, devem chegar nas mãos da minha Princesa. É importante que ela saiba o quanto eu fui apaixonada nesta vida tão breve.

Continua... 

segunda-feira, 4 de junho de 2012

50)-Parte I: Eu, Cristina Moraes (Crônica)



Antes de fechar os meus olhos a última imagem que vi foi a da minha princesa. Eu estava deitada na cama com os olhos fixados no teto e ela estava ali, na minha imaginação, mas parecia tão real... Chovia muito naquele dia, mas eu não ouvi as gotas baterem na janela. Apenas me recordo que chovia. A luz do abajur dava um tom gracioso para o meu quarto. A minha mãe havia deixado tudo arrumado; os livros estavam todos organizados nas prateleiras, a minha escrivaninha também estava em ordem, as canetas estavam dentro daquela caneca que eu tinha ganhado de presente no dia em que completamos um ano de amizade, o painel com as nossas fotografias dava ainda mais vida às minhas lembranças, tanto que ficava bem em frente a minha mesa e quando eu queria alguma inspiração eu olhava para nós e me enchia de ideias, a luminária estava desligada, haviam sobre a escrivaninha apenas dois CDs, uma caneta e uma folha com alguma coisa que eu tinha escrito – agora não me recordo.  O meu quarto estava tão perfumado. Os ursos pareciam olhar para mim, todos enchiam de carinho aquele cantinho que era meu, só meu. A minha cama estava mais macia naquele dia...
Dias, sempre busquei fazer destes perfeitos. Mas antes de escrever sobre eles deixe eu me apresentar: O meu nome é Cristina de Moraes, pelo que eu me lembro eu tenho quinze anos de idade, eu era a filha mais nova. Agora meu irmão está com vinte e um anos, morro de saudades dele... Ele ainda continua com aquele mesmo jeitão alegre, engraçado, um sorriso lindo, ele odiava quando eu o imitava, ele tem bom coração e é apaixonado pela namorada. Às vezes ouço-o chorando, ele também sente a minha falta.
Eu consigo ouvir as orações dos meus pais. Todos os dias eles vão à Igreja. Oram por mim. Minha mãe chora quando não me sente mais ao lado dela. Meu pai se aquieta quando olha para o lugar que eu sentava – parece que ele ainda me vê ali, quietinha assistindo ao culto com a cabeça apoiada nos ombros da minha mãe. Sinto que o meu pai derrama muitas lágrimas por dentro, mas nestes anos todos tem se mostrado um homem forte e cheio de coragem. Eles sabiam que eu os amava muito.
Você, que está me lendo, me perdoe... Não conseguirei escrever mais sobre a minha família, os meus olhos estão se enchendo de lágrimas e eu não quero chorar, prometi que não iria chorar, nunca mais...
Escrevo sobre os meus dias. Perfeitos... Nunca me preocupei se os meus cabelos estavam arrumados, se o meu rímel estava borrado, enfim, nunca me cobrei. Vivi histórias incríveis, senti emoções que muitas pessoas de cinqüenta anos nunca sentiram. Cada capítulo da minha história tinha uma trilha sonora diferente. Sempre amei música! Sempre a amei também...
Há dias que me imaginava dentro da minha própria solidão e me sentia como se estivesse numa praia, a brisa que batia em meu rosto e aquela água fria que refrescava os meus pés descalços me dava a sensação de estar livre de toda aquela gente horrível e chata que me cercava. Eu queria ter construído um mundo lindo só para viver junto da minha amada. Essa seria a outra forma de viver bem, com ela ao meu lado eu não precisaria viver apenas de solidão. Viveríamos no nosso silêncio. Quando debruçássemos na janela a paisagem lá fora estaria sempre bonita, o sol sempre irradiante. Nada de carros, só ouviríamos o canto dos pássaros e o balançar das árvores. A voz dela sussurrando em meus ouvidos dizendo-me que me ama e que sempre me amará, para mim, seria o suficiente. Mas tudo isso foi apenas um sonho e nada mais.
No meu quarto o tempo parou. Eu não ouvia mais o tic-tac do relógio. Covardemente eu dava naquele momento o último gole de monotonia. Envenenei-me de tristeza, eu já me encontrava muito fraca, mas eu segurava um lenço que tinha impregnado o perfume da minha amada, levei-o até o meu nariz e naquele instante eu não suspirava pela última vez, mas sim, a sentia pela última vez.

Continua...